Pareceres
Imparidades
25 Agosto 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.


Imparidades
PT28602 – maio de 2025

 


No ano de 2023 foi criada uma imparidade de outros devedores e credores, mas esse valor foi ajustado na declaração modelo 22, pois não foi aceite fiscalmente, no campo 718.
Em 2024 vai ser revertida na totalidade. Deve ajustar-se esse valor na declaração modelo 22? Em que campo?

 

Parecer técnico

 

O pedido de parecer refere-se ao enquadramento contabilístico e fiscal, na reversão de uma perda por imparidade.
Não é indicado qual o referencial contabilístico aplicável na entidade em causa, pelo que, nas considerações que faremos, tomaremos por base o regime contabilístico para as microentidades. De todo o modo, neste caso em concreto, a adoção de diferentes níveis de normalização contabilística não alteraria o sentido do nosso parecer.
Uma entidade deve mensurar os seus ativos financeiros ao custo, entendido como a quantia nominal dos direitos contratuais envolvidos. Ativos financeiros relativos a contas a receber e a participações de capital são mensurados ao custo de aquisição, sujeito a ajustamentos subsequentes derivadas de eventuais imparidades (parágrafo 17.3 da NC-ME).
Para determinar se um ativo financeiro está ou não com imparidade, uma entidade deve rever a sua quantia escriturada, bem como determinar a sua quantia recuperável e reconhecer (ou reverter o reconhecimento de) uma perda por imparidade, designadamente em contas a receber (parágrafo 17.6 da NC-ME).
A evidência objetiva de que um ativo financeiro pode estar em imparidade é usualmente mostrada, por exemplo, pelas dificuldades financeiras ou quebra contratual do devedor ou do emitente, ou por cotação oficial inferior ao custo de aquisição (parágrafo 17.3 da NC-ME).
Os preparadores das demonstrações financeiras têm de lutar com as incertezas que inevitavelmente rodeiam muitos acontecimentos e circunstâncias, tais como a cobrabilidade duvidosa de dívidas a receber, a vida útil provável de instalações e equipamentos e o número de reclamações de garantia que possam ocorrer.
Tais incertezas são reconhecidas através da divulgação da sua natureza e extensão e pela aplicação de prudência na preparação das demonstrações financeiras. A prudência é a inclusão de um grau de precaução no exercício dos juízos necessários ao fazer as estimativas necessárias em condições de incerteza, de forma que os ativos ou os rendimentos não sejam sobreavaliados e os passivos ou os gastos não sejam subavaliados. Porém, o exercício da prudência não permite, por exemplo, a criação de reservas ocultas ou provisões excessivas, a subavaliação deliberada de ativos ou de rendimentos, ou a deliberada sobreavaliação de passivos ou de gastos, porque as demonstrações financeiras não seriam neutras e, por isso, não teriam a qualidade de fiabilidade (parágrafo 37 da estrutura concetual do SNC).
As normas contabilísticas não apresentam, nem faria sentido que o fizessem, regras objetivas que determinem o reconhecimento de perdas por imparidade em dívidas a receber. Consequentemente, haverá sempre que invocar juízos de valor na avaliação do risco de incobrabilidade de contas a receber.
As perdas por imparidade em dívidas a receber são tratadas, fiscalmente, nos artigos 28.º-A e 28.º-B do Código do IRC. Genericamente, podem ser deduzidas para efeitos fiscais, quando reconhecidas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores, as perdas por imparidade relacionadas com créditos resultantes da atividade normal, incluindo os juros pelo atraso no cumprimento de obrigação, que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade.
Consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:
- O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização (PER) ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial ao abrigo do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto;
- Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;
- Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento. Neste caso, o montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora: 25 por cento para créditos em mora há mais de seis meses e até 12 meses; 50 por cento para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses; 75 por cento para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses; 100 por cento para créditos em mora há mais de 24 meses.
Relativamente ao conceito de «atividade normal», o Código do IRC não o define com rigor, o que por vezes gera alguma litigância. A Autoridade Tributária e Aduaneira entende que os adiantamentos a fornecedores e os créditos decorrentes das vendas de bens de investimento, por exemplo, não são relevantes para efeitos da constituição de perdas por imparidade para efeitos fiscais (parecer n.º 115/95, do Centro de Estudos Fiscais).
O facto de o artigo 28.º-B do Código do IRC estabelecer que as perdas por imparidade só podem ser aceites como gastos a partir do momento em que o crédito se encontre em mora há mais de seis meses não significa que se perca a possibilidade de esses gastos serem aceites fiscalmente logo que preenchida a condição de uma mora superior a seis meses.
Se, por exemplo, não obstante o atraso no pagamento de determinado cliente, nunca se apurou a existência de um risco de incobrabilidade desse crédito e apenas após o decurso de mais de dois anos de dilação é que se teve indícios fundados da sua possível incobrabilidade, pode ser aceite como gasto dedutível a perda por imparidade a 100 por cento, em virtude de a mora ser superior a 24 meses, desde que se consiga provar que apenas nesse período de tributação, e não em nenhum período de tributação anterior, se verificou o risco de incobrabilidade desse crédito. Porém, se um crédito reunia condições para ser considerado de cobrança duvidosa num período anterior, mas não o foi, não será possível considerar essa perda posteriormente.
No caso apresentado, uma determinada entidade reconheceu, no período de 2023, uma perda por imparidade de um cliente, tendo esta sido acrescida no campo 718 do quadro 07 da declaração periódica de rendimentos (modelo 22), pelo que pressupomos, devido às limitações impostas pelo CIRC.
No período de 2024, é referido que a imparidade será revertida. Ora, não tendo a perda por imparidade sido fiscalmente dedutível anteriormente, também os eventuais rendimentos decorrentes da reversão daquela perda por imparidade não serão tributados, conforme o n.º 3 do artigo 28.º-A do CIRC, pelo que deverão ser deduzidos no campo 762 do quadro 07 da declaração modelo 22.