Pareceres
Documentos de suporte e localização das prestações de serviços
24 November 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

Documentos de suporte 
e localização das prestações de serviços
PT28883 – outubro de 2025

 

Determinado trabalhador em nome individual, com contabilidade organizada, adquire serviços a pessoas singulares na Alemanha.
Constatou-se que um desses prestadores de serviço (operador de câmara), após consulta o NIF no VIES, não está validado para transações na UE.
O trabalhador em nome individual já foi avisado, mas continuam a ser recebidas faturas deste prestador de serviço. Como proceder ao lançamento deste documento? É fiscalmente aceite? Como é o lançamento do IVA? Como vai declarado na modelo 30?

 

Parecer técnico

 

As questões colocadas referem-se ao enquadramento fiscal da aquisição de prestações de serviços a fornecedores intracomunitários que não têm o NIF válido no VIES.
Estão previstas duas regras gerais de localização das prestações de serviços que constam no número 6 do artigo 6.º do Código do IVA.
Nas prestações de serviços que tenham como destinatários sujeitos passivos do imposto, a regra geral de localização atende ao lugar em que estes disponham da respetiva sede, de um estabelecimento estável ou do domicílio fiscal [alínea a)].
Quando o destinatário dos serviços não seja um sujeito passivo de IVA, a operação é tributada no lugar da sede, estabelecimento estável ou domicílio do prestador dos serviços [alínea b)].
É preciso sempre, no entanto, averiguar se a situação exposta não se encontra prevista nas exceções (números 7 e 8 para sujeitos passivos e não sujeitos passivos; números 9, 10 e 11 apenas para não sujeitos passivos; e os números seguintes são para situações residuais).
Analisando estas regras específicas, concluímos que as prestações de serviços de «operador de câmara» (e demais operações acessórias), quando efetuados entre dois sujeitos passivos de IVA (B2B), não se enquadram em nenhuma regra específica, pelo que terá de ser aplicada a regra geral da alínea a) do número 6 do artigo 6.º do CIVA.
Este enquadramento torna irrelevante o sítio onde o serviço é materialmente executado, o que faz com que a operação seja tributada no local onde se situe a sede do adquirente dos serviços, o que, neste caso, será em Portugal, sendo tributada nos termos gerais do CIVA, não sendo relevante, para este efeito, se o NIF do fornecedor se encontra, ou não, válido no VIES.
Este entendimento é corroborado pelo ofício-circulado n.º 30 115/2009, de 29 de dezembro.
Em resultado deste enquadramento, o sujeito passivo português, entidade adquirente das prestações de serviços em causa, efetuadas por entidades estrangeiras, tornar-se-á sujeito passivo por esta aquisição, face ao disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA, que refere que:
«e) As pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea a), pela aquisição dos serviços abrangidos pela alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º, quando os respetivos prestadores não tenham, no território nacional, sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, a partir do qual os serviços são prestados.»
Perante este enquadramento, o sujeito passivo deverá proceder, em circunstâncias normais, à autoliquidação do imposto em território nacional, sendo esta autoliquidação, regra geral, feita na declaração periódica, nomeadamente, caso o fornecedor seja intracomunitário, nos campos 16 e 17 do quadro 06 da declaração periódica do IVA.
Este imposto autoliquidado, tal como resulta da alínea c) do número 1 e do número 8 do artigo 19.º do CIVA, caso estejam cumpridos os restantes requisitos para que tal direito possa ser exercido, poderá, regra geral, ser deduzido, sendo esta dedução, em qualquer caso, feita no campo 24 do quadro 06.
Quanto ao enquadramento em sede de IRC, no tocante à aceitação fiscal, o número 1 do artigo 23.º do CIRC indica que «para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.»
Assim, em primeiro lugar, para que um gasto seja aceite fiscalmente, terá o sujeito passivo de conseguir comprovar que o mesmo foi incorrido ou suportado para obter ou garantir rendimentos sujeitos a IRC.
No caso concreto, por estarmos perante uma fatura relativa a um serviço de «operador de câmara», caso tal gasto tenha sido afeto à atividade normal do sujeito passivo e, desse modo, contribuído, ainda que genericamente, para a obtenção de rendimentos sujeitos e não isentos de IRC, então, somos de opinião de que o mesmo poderá ser, de facto, à partida, aceite fiscalmente.
Ora, para além da condição referida anteriormente, será sempre preciso ter em conta o disposto no número 3 do mesmo artigo 23.º do CIRC, que refere:
«3 - Os gastos dedutíveis nos termos dos números anteriores devem estar comprovados documentalmente, independentemente da natureza ou suporte dos documentos utilizados para esse efeito.»
De forma a complementar esta disposição, estabelece o número 4 do mesmo artigo que: «4 - No caso de gastos incorridos ou suportados pelo sujeito passivo com a aquisição de bens ou serviços, o documento comprovativo a que se refere o número anterior deve conter, pelo menos, os seguintes elementos:
a) Nome ou denominação social do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário;
b) Números de identificação fiscal do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário, sempre que se trate de entidades com residência ou estabelecimento estável no território nacional;
c) Quantidade e denominação usual dos bens adquiridos ou dos serviços prestados;
d) Valor da contraprestação, designadamente o preço;
e) Data em que os bens foram adquiridos ou em que os serviços foram realizados.»
Nesta sequência, refere ainda o número 6 do artigo 23.º do CIRC, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 49/2025, de 27 de março, que:
«6 - Quando o fornecedor dos bens ou prestador dos serviços esteja obrigado à emissão de fatura nos termos do Código do IVA, o documento comprovativo das aquisições de bens ou serviços previsto no n.º 4 deve obrigatoriamente assumir essa forma.»
Deste modo, para efeitos de IRC, os gastos dedutíveis têm que estar comprovados documentalmente através de fatura ou documento legalmente equiparado emitido nos termos do CIVA quando o fornecedor dos bens ou prestador dos serviços esteja obrigado à sua emissão, ou, então, através de documento que contenha os elementos referidos no n.º 4 do artigo 23.º do CIRC - como será o caso de aquisições de bens ou serviços a entidades estrangeiras.
Assim, as aquisições de bens ou serviços a sujeitos passivos nacionais que tenham de ser suportadas por faturas emitidas nos termos do CIVA e demais legislação complementar, caso não cumpram o disposto no número 5 do artigo 36.º ou no número 4 do artigo 40.º, ambos do CIVA (como, por exemplo, não tenham o NIF do adquirente sujeito passivo) e, por isso, não se encontrem na sua «forma legal», na nossa opinião, o respetivo gasto não será aceite fiscalmente, nem o IVA poderá ser dedutível, face à limitação imposta no número 2 do artigo 19.º do CIVA.
Por outro lado, as aquisições de bens (ou de serviços prestados no estrangeiro) a fornecedores não residentes sem estabelecimento estável em Portugal, a que se possa imputar essa operação, não necessitam de estar suportadas por faturas nos termos previstos no Código do IVA português, para efeitos da dedução fiscal em IRC desses encargos pelo sujeito passivo adquirente nacional, bastando que se possa obter do documento em causa os referidos elementos previstos no n.º 4 do artigo 23.º do CIRC.
De facto, será preciso ter em conta que embora o IVA seja, como sabemos, um imposto comunitário, as suas regras em matéria de faturação não se encontram totalmente harmonizadas pelos vários Estados-membros da União Europeia.
Assim, as regras de faturação previstas, por exemplo, nos Códigos do IVA espanhol, francês e alemão, poderão não ser necessariamente similares às existentes no CIVA português (e demais legislação nacional), sendo sempre necessário averiguar, sempre que possível, tais pormenores junto dos intervenientes.
Por outro lado, note-se que existem países terceiros, como os Estados Unidos da América (EUA), nos quais não existe, por exemplo, o conceito de NIF, pelo que não poderá a Autoridade Tributária, a nosso ver, fazer depender a aceitação do gasto em termos fiscais de um dado inexistente no país do fornecedor.
Sem prejuízo do referido nos parágrafos anteriores, alertamos que, caso os documentos não tenham os referidos elementos previstos no n.º 4 do artigo 23.º do CIRC (nomeadamente, neste caso, os elementos identificativos do adquirente sujeito passivo português), poderá a Autoridade Tributária e Aduaneira considerar tais despesas como encargos não devidamente documentados, não sendo, deste modo, nos termos da alínea c) do número 1 do artigo 23.º-A, como sabemos, aceites fiscalmente (não se encontrando, contudo, sujeitos a qualquer tributação autónoma).
Aconselhamos, deste modo, a que se confirme tal pormenor junto dos intervenientes, sendo certo que, ainda que se trate de uma fatura ou outro documento simplificado, desde que contenha os elementos previstos no número 4 do artigo 23.º do CIRC (não constando de tais requisitos o facto de o NIF do fornecedor ter de estar válido no VIES), não poderá a Autoridade Tributária contestar a sua aceitação fiscal.
Recomendamos, sobre esta matéria, a visualização da resposta dada na Reunião Livre de 10 de setembro, a partir do minuto: 4h17m25s, a uma questão congénere à colocada, através desta ligação.
Sugerimos, ainda, a leitura da informação vinculativa referente ao processo n.º 4 942/22; PIV 23 791; despacho de 2022-10-25, da diretora de serviços, proferido por subdelegação de competências.
Por fim, quanto à obrigatoriedade de submeter a declaração modelo 30, refira-se que, por estarmos perante rendimentos que, nos termos da alínea f) do número 1 do artigo 18.º do CIRS, são considerados como obtidos em Portugal, seja, ou não, feita retenção na fonte (aconselhamos, sobre esta matéria, a que se analise o artigo 14.º da CDT celebrada entre Portugal e a Alemanha, bem como o disposto no artigo 101.º-C do CIRS), a declaração modelo 30 deverá ser sempre entregue até ao fim do segundo mês seguinte ao do pagamento, nos termos do n.º 7 do artigo 119.º do CIRS e do artigo 128.º do CIRC, sendo que este último remete para o Código do IRS.
Poderá encontrar o modelo oficial desta declaração nesta ligação.
Relativamente à questão «Como vai declarado na modelo 30?», estando em causa, de acordo com o referido na questão, particulares prestadores de serviços, deverá, no campo 35 do quadro 08, ser inscrito o código «14 - Trabalho independente.»

 

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