Entrevista
Entrevista a Filipe Cartaxo, administrador do Banco Europeu de Investimento
10 October 2025
filipecartaxo3
«A união dos mercados de capitais é uma das reformas essenciais a realizar pela UE»


A desempenhar funções desde 2018 no Banco Europeu de Investimento, Filipe Cartaxo sinaliza o «renovado interesse» nos financiamentos do grupo BEI por parte da maior parte dos estados-membros e explica como funciona o processo de submissão de candidaturas. O administrador da principal instituição financeira da UE defende ainda que «os contabilistas certificados poderão e deverão assumir, no âmbito da sustentabilidade, um papel insubstituível na preparação e validação das necessidades de reporte e divulgação de informação.»


Contabilista – O BEI é o banco da União Europeia (UE), sendo a sua principal instituição financeira. Os 27 estados-membros são os seus acionistas. Os portugueses e muitos cidadãos europeus têm a plena consciência de que muitos projetos no âmbito dos transportes, telecomunicações, digitalização e sustentabilidade proveem do braço financeiro da UE?

Filipe Cartaxo – Em primeiro lugar, permita-me que agradeça o vosso amável convite, sublinhando que as opiniões agora expressas são estritamente pessoais, não refletindo necessariamente os pontos de vista e opiniões do Banco. Respondendo à sua pergunta, apesar do esforço que tem vindo a ser feito para corrigir o tradicional low profile do Grupo BEI (veja-se, por todos, a forma muito dinâmica como a ação executiva do BEI hoje comunica no seu website e nas principais redes sociais) há, em nossa opinião, algo ainda a fazer nesta matéria. Não só no momento da aprovação ou assinatura das operações, mas também quando os projetos e empreendimentos se encontram já em funcionamento. Isso poderia contribuir para uma melhor compreensão e divulgação da atividade da instituição.   Após a realização dos projetos, em primeira mão, permitam-me a observação, é aos clientes do BEI que caberá divulgar que o empreendimento foi objeto de financiamento pelo BEI na forma e pelos meios que forem considerados adequados. Estou persuadido que o BEI não deixará de apoiar esse tipo de iniciativa sempre que para tal for convidado. Não somente pela participação específica do BEI, mas para que seja divulgado e explicado o projeto ou o empreendimento que mereceu esse financiamento. 

Em resposta à crise sanitária, o BEI teve um papel central na reconstrução das economias europeias. Em entrevista que concedeu a esta revista, em 2021, o então vice-presidente do BEI, Ricardo Mourinho Félix, dizia que o banco «deve ter sempre uma postura contra cíclica». Subscreve?

Esse papel é muitíssimo importante como se veio a verificar, em especial, na resposta ao COVID. Mas decisivo é que o BEI esteja sempre preparado para responder a esse tipo de situações ou outras que venham a exigir respostas prontas. Isso impõe que o BEI mantenha níveis ótimos de capitalização, com buffers adequados, próprios de uma instituição com o rating máximo internacional AAA, sem fins lucrativos, mas desde sempre superavitária, que lhe permitam apoiar respostas contra cíclicas céleres. 
Importa sublinhar, no entanto, que, por si só, nenhuma instituição multilateral está em condições de fazer frente a situações recessivas. Essa foi a enorme lição da crise COVID sendo de enaltecer a convergência, pronta, porventura sem paralelo, que então existiu na resposta formulada pela família comunitária a uma crise sem precedentes.  Sublinho ainda que essa é uma obrigação estatutária da instituição visto que uma das suas missões vitais é a contribuição para o financiamento de investimento nas regiões menos favorecidas da UE – as regiões de Coesão –, que, em regra, enfrentam situações do tipo “contracíclico”, de natureza estrutural. Mesmo em situações de crescimento económico será muito importante que o BEI não esmoreça no cumprimento, entre outros, dos seus objetivos estratégicos prioritários e dessa sua missão estatuária claramente consagrada e reforçada no Protocolo nº 28 ao Tratado de Lisboa. Com uma atuação notavelmente transparente e profissional (veja-se, por todos, os relatórios publicados pela instituição) que pugna em aplicar as melhores práticas bancárias, sublinho, as melhores práticas bancárias, em todos os domínios da sua atividade.

A Europa está confrontada com múltiplos desafios e todos eles exigem um avultado esforço financeiro. Para além dos alertas deixados pelo relatório Draghi, no âmbito da competitividade, o investimento em defesa e na reconstrução da Ucrânia já foram compromissos assumidos. Perante este contexto, considera fundamental por exemplo, aprofundar o papel do BEI, enquanto braço financeiro da UE, na mobilização de capital privado através de obrigações de longo prazo e desenvolver a união dos mercados de capitais?

A união dos mercados de capitais é uma das reformas essenciais a realizar em tempo útil pela União Europeia, desejavelmente sem tergiversar. Não obstante o progresso realizado com a introdução do euro, subsiste um nível de fragmentação muitíssimo elevado no sistema bancário e financeiro da União Europeia (ainda resultado da crise da dívida soberana), mesmo nos Estados-membros que integram o euro. Isto é válido não só no mercado bancário propriamente dito, em particular no crédito a médio e longo prazo a pequenas e médias empresas (PME) e a mid-caps (até 3000 empregados na definição BEI) como no capital de risco, nas suas diferentes componentes (venture capital, private equity, venture debt, etc). No caso específico do financiamento das PME o reforço e simplificação das operações de securitização (ou titularização) dos empréstimos bancários a PME e mid-cap. Em dois domínios principais: no incentivo às operações que se qualificam como simples, transparentes e standardizadas (em minha opinião, indispensáveis para uma boa compreensão do mercado) e na promoção, quiçá com o apoio da Comissão Europeia, de operações em plataformas pan-europeias com carteiras de crédito a PME e mid-caps em múltiplos Estados-membros da União Europeia. Relativamente ao mercado obrigacionista, o papel do BEI tem sido sempre muito significativo com a preocupação permanente em inovar (veja-se o papel no lançamento de green bonds). Importaria definir um programa claro de medidas que favoreçam a criação de um mercado de capitais único europeu, salvo melhor opinião. 


Segundo um estudo recente, os portugueses são dos que mais apoiam a criação de novos impostos para financiar o orçamento de longo prazo da UE, em alternativa a um aumento das contribuições nacionais. Esta pode ser outra via para suprir as necessidades e exigências financeiras do projeto europeu?

Esse apoio indicia um nível de adesão significativo ao projeto europeu o que me apraz registar. Há muito, mas mesmo muito tempo, que o reforço do orçamento comunitário é apontado como medida indissociável do aprofundamento do projeto europeu e da consolidação do euro, em especial nas circunstâncias atuais que estão a colocar desafios sem paralelo. Como foi previsto por um dos fundadores do projeto europeu, progressos significativos na construção europeia só se têm verificado como resposta a situações de crise severa. Seria indispensável consolidar uma visão de longo prazo para o projeto europeu com metas temporais bem definidas a exemplo do que se verificou com o euro. A introdução do regime 28.º nalguns domínios – se não me engano, o primeiro (de muitos, desejavelmente) está em consulta pública atualmente pela Comissão Europeia – seria certamente uma medida mais imediata com potencial significativo.

O governo português e o BEI assinaram a 18 de setembro um acordo para uma nova linha de crédito de 1,3 mil milhões de euros destinada à construção de 12 mil casas, no âmbito do «Programa acessível», tendo em visto financiar habitações a preços acessíveis e criar um parque habitacional com rendas inferiores às do mercado. De acordo com a avaliação do BEI este projeto deverá ajudar à criação de emprego e ao incremento de competitividade das cidades. Socialmente, é um investimento estruturante, prioritário e com um retorno que corresponde ao core do BEI?

Sem dúvida. Portugal, aliás, há umas décadas atrás (que recordo, com saudade, lembrando o trabalho do Prof. Valente de Oliveira e da Dra. Isabel Mota, personalidades vitais no arranque e consolidação do projeto luso-europeu, do Dr. Jorge Sampaio e sua equipa do município de Lisboa que, entre outras, concretizou a primeira operação de financiamento de habitação em Portugal e do Eng. João Cravinho em múltiplas iniciativas) teve um papel muitíssimo importante na chamada de atenção à Comissão Europeia e ao BEI para a necessidade de que essa atividade (tal como os projetos do setor da saúde) passasse a ser elegível para o financiamento comunitário. O que só se veio a verificar em 1999 (se a memória não me falha). Em Portugal, nesse mesmo ano, no mandato do Dr. Jorge Sampaio. 
Graças a esse trabalho essas três atividades são hoje plenamente elegíveis do BEI. Muito em especial o financiamento da habitação social e renda acessível (tal como a educação e a saúde) que integra as prioridades máximas estratégicas de financiamento do BEI para os próximos anos. Na situação atual, gravíssima em muitos Estados-membros e, em particular, em Portugal, é indispensável que sejam tomadas medidas efetivas para a inverter recorrendo a todos os instrumentos disponíveis e, sempre que necessário, criando novo como parece ser o caso em Portugal no caso da habitação: oferta pública, central e municipal, quer diretamente quer em regime de concessão ao setor privado e/ou social todas muito bem reguladas, com critérios e formulações simples e transparentes e governação adequada. Na habitação –  em que a iniciativa pública é vital –  encontre-se inspiração nas boas práticas dos Estados-membros com mais experiência no apoio ao investimento neste setor (com especial destaque, em minha opinião, para a experiência austríaca concebida em período de crise grave como a que atualmente atravessamos) - em que, repito, a iniciativa pública é incontornável. Espero que isso seja em breve inequivocamente reconhecido pela Comissão Europeia. Com um enorme sentido de urgência.  O BEI está e estará certamente na primeira linha de apoio. 

Pode explicar-nos, de uma forma geral, como funciona o processo de submissão de candidaturas e a respetiva avaliação, análise e eventual aprovação por parte dos órgãos de gestão do organismo europeu?

O BEI dispõe de um gabinete em Lisboa praticamente desde a adesão. Passou de um gabinete com um quadro técnico, em 1986 (logo após a adesão, com um trabalho excecional de Dominique de Crayencour), a um conjunto de quadros técnicos muitíssimo experientes que estão sempre disponíveis para apoiar qualquer agente económico, do setor público, privado ou social, que pretenda promover um programa ou projeto de investimento que se enquadre nas atividades elegíveis para a instituição. O gabinete dispõe de todos os meios para assegurar, em permanência, o contacto, em tempo real, com a sede do Banco no Luxemburgo sempre que necessário. Hoje, o BEI dispõe ainda de um serviço de aconselhamento (advisory services) que poderá e deverá ser chamado a colaborar sempre que projetos estruturantes e/ou inovadores necessitem desse tipo de serviços.
Uma vez confirmada a referida elegibilidade nesses contactos iniciais, é designada uma equipa técnica multidisciplinar que analisa o projeto do ponto de vista técnico, económico e financeiro, e o submete a decisão do Comité Executivo e do Conselho de Administração.  A equipa multidisciplinar mantém a empresa candidata informada do progresso no processo de decisão que envolve consulta à Comissão Europeia e ao Estado-membro em que o projeto se localiza. As equipas do BEI e os seus órgãos de decisão, executivo e não executivo, estão especialmente empenhadas em que este processo seja concluído em tempo útil e essa é hoje uma prioridade da instituição plenamente assumida por todos no Banco.

Um dos principais focos da ação do BEI é a ação climática e a sustentabilidade, sendo o banco um dos maiores financiadores mundiais de projetos relacionados com o clima e o ambiente, com o objetivo de acelerar a transição verde. Como avalia a forma como a UE se está a posicionar neste domínio?

De uma forma notável, no caso do BEI. Apesar de se tratar de uma missão especialmente desafiante (devo confessar a minha interrogação inicial face à dimensão do desafio e aos elevados objetivos quantitativos então assumidos pela instituição), reconheço hoje que as minhas expectativas foram largamente ultrapassadas pelo grau de profissionalismo demonstrado por todos no Banco. O resultado está à vista e o BEI cumpriu os objetivos essenciais a que se tinha proposto no Climate Bank Road Map aprovado em 2020 (2021-2025) e que o colocam hoje como o Climate Bank – o Banco do Clima – da União Europeia. Estou convencido que é um esforço que irá prosseguir agora talvez em circunstâncias internacionais bastante mais adversas que impõem ainda maior vontade e determinação.  Neste capítulo, sublinho a importância de que se reveste no cumprimento dos objetivos climáticos, a definição pelos Estados-membros de prioridades precisas e concretas nos investimentos de adaptação às alterações climáticas (Infraestruturas e agricultura resilientes, saúde pública, etc.). 

O BEI tem um papel fundamental no apoio ao financiamento a longo prazo de empresas, nomeadamente concedendo linhas de crédito a intermediários financeiros para projetos de menor dimensão, como é o caso das PME. O nosso tecido empresarial está suficientemente desperto e consciente para esta possibilidade?

Decorridos quase 40 anos após a adesão, há hoje uma relação estreita entre os principais bancos portugueses e o Grupo BEI.  Três deles, aliás, a CGD, o BPI e o Banco Português de Fomento (BPF) são hoje acionistas do Fundo Europeu de Investimento (FEI) o braço do grupo para o financiamento de risco a PME e mid-caps, sob a forma de prestação de garantias (a bancos a fundos especializados no crédito a médio e longo prazo a PME) e o apoio a fundos de fundos de capital de risco (venture capital e private equity). Creio que o BPF está hoje especialmente empenhado em aprofundar essa cooperação. Pode, finalmente, vir a desempenhar um papel importante para reforçar a oferta de crédito a longo prazo a PME e mid-caps a instituições financeiras que pretendam desenvolver essa vertente da atividade bancária em Portugal. A CGD e o BPI são parceiros de longa data, tal como o Santander, e verifico, com apreço, o interesse crescente que a atividade do Grupo BEI tem vindo a merecer ao Millennium BCP, ao Novo Banco e ao Montepio e, claro, ao BPF.

Os contabilistas certificados estão em todas as empresas e, como não podia deixar de ser, também nas PME, a espinha dorsal da economia portuguesa e também da UE. De que forma é que a sua capilaridade pode ser decisiva para consciencializar os empresários para a submissão de candidaturas ao BEI, aferindo antecipadamente a sua elegibilidade e promovendo uma cultura empresarial menos conservadora e mais virada para o risco?

Os contabilistas certificados estão numa posição privilegiada para desenvolver esse trabalho pela sua permanente ligação e conhecimento da atividade empresarial, em todos os setores, e, consequentemente, pela sua capacidade em identificar as suas necessidades de financiamento ao investimento, seja sob a forma de crédito seja sob a forma de capital de risco.  Estão, assim, na primeira linha para compreender as virtualidades e méritos, em nossa opinião incontornáveis, dos empréstimos e prestação de garantias do BEI e também da atividade de capital de risco dirigida a fundos de fundos do FEI.


A capitalização das empresas portuguesas é uma eterna dificuldade. O BEI tem mantido contactos com o governo português para dar respostas a esta dificuldade, procurando soluções em matéria de instrumentos de capitalização?

Há uns anos, numa situação económica particularmente exigente, o Fundo Europeu de Investimento (FEI) – então liderado por um chief officer notável, Francis Carpenter, com um enorme conhecimento sobre Portugal –, deu o exemplo promovendo a estruturação do primeiro fundo de fundos de capital de risco destinado a PME (PvCI) em conjunto com um número significativo de instituições financeiras nacionais e com a Fundação Calouste Gulbenkian. Creio que ela mobilizou os melhores operadores de venture capital e private equity no mercado nacional. Seguiram-se outras iniciativas, atualmente em curso e que são do domínio público - Portugal Tech, Portugal Growth, e Portugal Blue. Ora, o Banco Português de Fomento (BPF), que, entretanto, passou a controlar a empresa pública de capital de risco Portugal Ventures, assumiu agora o papel central no setor com verbas muito importantes. O FEI está certamente em contacto estreito com o BPF para apoiar a sua atividade neste domínio sempre que tal for considerado desejável. Isso mesmo verificou-se recentemente no que diz respeito à prestação de garantias a instituições financeiras (para benefício das condições de crédito a PME) no âmbito do PRR. De resto, correspondendo à prioridade bem delineada no próprio programa do Governo. Como acionista do FEI –, mesmo antes da sua criação como banco – dada a excelente prática de trabalho do FEI com todos os seus acionistas, o BPF dispõe de toda a informação e contactos necessários para tirar pleno partido dessa parceria. E, obviamente, de uma total convergência de objetivos com o BEI e a Comissão Europeia, os dois principais acionistas do FEI.

No atual contexto, as empresas que resistam a investir em transição digital, projetos sustentáveis e no domínio da inovação podem ter a sua sobrevivência ameaçada?  O BEI está sensível para esta questão?

A inovação é uma das outras prioridades estratégicas definidas pelo Banco e pelo FEI há já alguns anos. E isso foi demonstrado, com o apoio excelente da Comissão Europeia, durante o COVID com a promoção de iniciativas de elevado risco muito bem-sucedidas como é do domínio público. Mantém-se como prioridade europeia inquestionável sublinhada no relatório Draghi.  E essa é, também, sem margem para dúvida, uma outra razão pela qual a atividade do BEI não pode esmorecer em qualquer conjuntura económica.

Ao nível da dimensão da sustentabilidade, que papel poderá ser desempenhado pelos contabilistas certificados em termos da preparação e validação das necessidades de reporte e divulgação de informação e qualidade por parte das empresas?

Seria desejável que em Portugal fossem adotadas boas práticas nesta matéria em especial agora que se caminha, por iniciativa, meritória segundo as informações de que disponho, da Comissão Europeia, para uma simplificação das obrigações das PME e mid-caps nesta matéria. Os contabilistas certificados poderão e deverão assumir neste domínio um papel insubstituível.

O BEI e o Banco Português de Fomento (BPF) mantêm uma relação de parceria estratégica, colaborando para financiar projetos no nosso país que promovam os objetivos da UE. Como qualifica o grau de articulação e sinergias entre as duas entidades?

Devo dizer que tenho enormes expectativas em relação ao desenvolvimento da atividade do BPF e, como não podia deixar de ser, em relação à cooperação com o Grupo BEI. Recordaria, aliás, que o BEI deu provas inequívocas dessa vontade no vultoso apoio que se prontificou a dar à IFD (precursora do BPF) entre 2018 e 2020. Não obstante todas a vicissitudes, não tenho dúvida que essa vontade se mantém intacta e talvez mesmo reforçada dado o conhecimento e experiência que a nova liderança do BPF dispõe sobre o Grupo BEI, em especial no domínio das PME. A minha expectativa não podia ser maior, em especial no desenvolvimento da atividade de natureza estritamente bancária. 

Pese embora o facto de o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ser financiado principalmente pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência da UE, o BEI é um parceiro estratégico para a implementação de investimentos. Qual o papel do banco na expansão do alcance dos investimentos previstos no PRR?

Toca num ponto fundamental. Retomando uma linha de atuação definida há muitos tempo (e aludo aos governantes que antes referi), foi, é e será altamente desejável combinar a utilização dos apoios com origem em programas comunitários com os créditos a longo prazo do BEI em todos os domínios em que isso seja possível. Creio que isso é hoje designado por blending (anteriormente conhecido como “co-financiamento”). Ora a concessão de crédito a longo prazo, ajustado à vida útil dos investimentos, em condições financeiras adequadas, só está ao alcance de instituições financeiras com rating internacional muito elevado. E o BEI merece certamente papel de destaque como a sua atividade, em Portugal e, em geral, na União Europeia, tem vindo a demonstrar. No caso específico do FEI, como referi antes, o mandato no domínio da prestação de garantias atribuído pelo Governo português e recentemente assinado em Santa Maria da Feira é prova do dinamismo e vontade da instituição em contribuir para essa boa aplicação dos fundos do PRR. 
Mas deixe-me concluir sublinhando que se verifica, em Portugal, tal como em quase todos os Estados-membros, um renovado interesse nos financiamentos do Grupo BEI. As operações de crédito a longo prazo recentemente assinadas nos setores da educação, saúde e habitação graças ao esforço coordenado do Ministério das Finanças e dos Ministérios das Infraestruturas e Habitação e da Educação são fruto disso. Sejamos todos ambiciosos – o BEI está a sê-lo inquestionavelmente com a nova liderança de Nadia Calviño e sua equipa, com o apoio do conselho de administração –  e consistentemente determinados convocando o Grupo BEI para o apoio a essas iniciativas. Tal como no passado, com o esforço de todos, o BEI não faltará a esse desafio. 



PERFIL
Filipe Cartaxo é economista, formado pelo Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa, acumulando uma vasta carreira no setor financeiro, nomeadamente no domínio de investimentos e financiamentos a longo prazo, tanto em Portugal como a nível europeu. Atualmente, é membro do conselho de administração do Banco Europeu de Investimento (BEI), criado no âmbito do Tratado de Roma, função que exerce desde 2018. Anteriormente, já tinha desempenhado outros cargos neste organismo, nomeadamente como chefe do gabinete de Lisboa e chefe de divisão no Luxemburgo. A sua longa experiência inclui posições de destaque, após o seu regresso a Portugal, como diretor central do Banco BPI e administrador do Fundo Europeu de Investimento (FEI) eleito, entre 2014 e 2018, pelos cerca de 30 acionistas da instituição, e, em 2023-2024, pelos seus pares no conselho de administração do BEI. Foi ainda membro, não executivo, do conselho de administração e da sua comissão de auditoria da Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD), entre 2018 e 2020, até à absorção pela SGPM dando origem ao BPF.


Entrevista Nuno Dias da Silva | Fotos Raquel Wise

Entrevista publicada na Revista Contabilista n.º 305 setembro 2025

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