Pareceres
IRS - Rendimentos obtidos no estrangeiro
24 June 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.


IRS - Rendimentos obtidos no estrangeiro
PT28511 - março 2025

 

Determinado trabalhador por conta de outrem, residente no Porto, trabalha na Galiza. Durante a semana está em Espanha e ao fim de semana vem a Portugal.
Esta pessoa é considerada um trabalhador transfronteiriço? Deverá entregar a declaração de IRS declarando em Portugal os rendimentos obtidos em Espanha, no anexo J? Sendo casado, e tendo dois filhos (todos os elementos residir em Portugal), entregará o IRS de todo o agregado familiar em Portugal? Deverá ter-se em atenção mais alguma questão?

 

Parecer técnico

 

O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento, em sede de IRS, da obtenção de rendimentos de trabalho dependente.
No caso é referido que um «(...) trabalhador (TCO) residente na cidade do Porto trabalha na Galiza. Durante a semana está em Espanha e ao fim de semana vem a Portugal.»
O Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) incide exclusivamente sobre as pessoas físicas ou singulares que residam em território português ou nele não residindo, aqui obtenham rendimentos.
No que diz respeito aos residentes, o imposto incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, ainda que obtidos fora do território nacional, nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Código do IRS (CIRS).
Quanto aos não residentes, a incidência teria obviamente de ser formulada em termos mais restritos, sujeitando apenas os rendimentos obtidos em território português, nos termos do n.º 2 do artigo 15.º do CIRS.
O conceito de residência a considerar, em sede de IRS, consta do artigo 16.º do CIRS:
«a) Haja nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;
b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual;
c) Em 31 de Dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva nesse território;
d) Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de carácter público, ao serviço do Estado Português.»
O artigo 19.º da Lei Geral Tributária (LGT) determina que o domicílio fiscal de sujeitos passivos pessoas singulares é o local da sua residência habitual, devendo esta ser obrigatoriamente comunicada à Autoridade Tributária.
Deste modo, primeiro que tudo, importa saber onde é que o referido trabalhador tem a sua residência fiscal.
Estando perante trabalhadores transfronteiriços (no caso do residente em Portugal e a trabalhar em Espanha), estes têm um regime próprio no que concerne ao estabelecimento da residência fiscal.
As convenções (ou acordos internacionais) estabelecem mecanismos para evitar ou atenuar a dupla tributação. De salientar, que o disposto em legislação internacional se sobrepõe ao disposto no direito interno.
No fundo, as convenções vêm determinar qual o Estado que tributa determinado tipo de rendimento. Por vezes atribuem legitimidade de tributação ao Estado de residência do beneficiário do rendimento, outras vezes atribuem legitimidade ao Estado da fonte do rendimento (da entidade pagadora), outras vezes ainda, repartem a tributação entre os dois Estados mediante a fixação de taxas limite.
Caso os rendimentos sejam auferidos por uma pessoa singular residente, ainda que sejam obtidos fora do território nacional, estão sujeitos a tributação em sede de IRS, nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do CIRS.
Não obstante, sendo tais rendimentos obtidos num outro Estado, também esse outro Estado poderá ter normas de incidência que prevejam a tributação de tais rendimentos.
Neste sentido, será indispensável aferir a existência de uma convenção para evitar a dupla tributação (CDT), celebrada entre ambos os Estados que permita eliminar esta dupla tributação.
O artigo 15.º da CDT celebrada entre Espanha e Portugal, regula a tributação dos rendimentos provenientes de profissões dependentes.
Assim, assumindo que o sujeito passivo é residente em Portugal, o n.º 1 do referido artigo 15.º menciona que os salários, ordenados e remunerações similares obtidas de um emprego por um residente de um Estado contratante (no caso, Portugal) só podem ser tributados nesse Estado (Portugal), a não ser que o emprego seja exercido no outro Estado (no caso, Espanha).
O n.º 2 estabelece que as remunerações só podem ser tributadas no Estado da residência, mas apenas quando se verifiquem cumulativamente três condições, a saber:
- O trabalhador não seja residente no Estado onde exerce o emprego;
- A entidade patronal que paga os rendimentos não seja residente no Estado onde é efetuado o trabalho;
- As remunerações não forem suportadas por um estabelecimento estável ou instalação fixa que a entidade patronal tenha no Estado da obtenção do rendimento.
No entanto, a CDT celebrada entre Portugal e Espanha salvaguarda, através de norma especial prevista no n.º 4 do artigo 15.º, o caso dos trabalhadores fronteiriços, considerando-se como tal aqueles que, trabalhando num Estado contratante (no caso, Espanha), têm a sua residência habitual no outro Estado contratante (no caso, Portugal), ao qual regressam normalmente todos os dias.
Nos termos da citada norma, as remunerações auferidas de um emprego exercido num Estado contratante (no caso, Espanha) por um trabalhador fronteiriço, isto é, que tenha a sua residência habitual no outro Estado contratante (Portugal) ao qual regressa normalmente todos os dias, só podem ser tributadas nesse outro Estado (Portugal).
Face ao exposto, e no caso apresentado na questão, tratando-se de um sujeito passivo residente em Portugal que presta serviços em Espanha, que, contudo, apenas regressa à sua residência aos fins de semana, entendemos que não será possível aplicar o disposto acima referido, ou seja, neste caso não qualificará como trabalhador transfronteiriço.
Assim, não se tratando de trabalhador transfronteiriço, mas tratando-se de rendimentos de trabalho dependente, exercido em Espanha, e auferidos por um residente fiscal em Portugal, tais rendimentos poderão ser tributados em ambos os Estados.
Não obstante, note-se que tal conclusão resulta do pressuposto de o citado sujeito passivo ser residente fiscal em território nacional, o que deverá ser aferido casuisticamente, nomeadamente pelo tempo de permanência, bem como pela existência de uma habitação que se considere residência habitual.
Na determinação da residência fiscal do sujeito passivo, note-se que o mesmo apenas poderá ser considerado residente em um Estado, pelo que em caso de conflito, será necessário recorrer à CDT para determinar a sua residência fiscal.
Sendo residente fiscal em Portugal, e obtendo rendimentos noutro Estado, no caso, em Espanha, note-se que nos termos do n.º 2 do artigo 23.º da CDT, no caso de um residente de Portugal, a dupla tributação será evitada, de acordo com as disposições aplicáveis da legislação portuguesa.
Assim, note-se que a resposta às questões colocadas está dependente do referido enquadramento do sujeito passivo, o qual deverá ser validado.
Não obstante, com base nos enquadramentos e esclarecimentos anteriores, entendemos que o sujeito passivo não será considerado um trabalhador transfronteiriço.
No que respeita à declaração dos rendimentos em Portugal, a resposta estará dependente da sua residência fiscal. Caso seja considerado residente fiscal em Portugal, os rendimentos deverão ser declarados no Anexo J, competindo a Portugal o crédito do imposto pago em Espanha.
Inversamente, caso se conclua que o sujeito passivo é residente fiscal em Espanha e que os rendimentos são lá obtidos, notamos que por referência a tais rendimentos não deverá entregar a declaração modelo 3 em Portugal.
Quanto ao agregado familiar, o mesmo também estará dependente da residência fiscal do sujeito passivo, motivo pelo qual é indispensável aferir o mesmo. Caso não seja residente fiscal em Portugal, notamos que não poderá entregar a declaração modelo 3 em conjunto com a sua esposa, residente fiscal em Portugal.
No que respeita à Segurança Social (sobretudo no caso de exercício de trabalho dependente) sugerimos a consulta direta desta entidade, pois depende da situação particular do trabalhador e dos acordos internacionais que sejam aplicáveis.
Não obstante, remetemos ainda para a consulta de informação disponível no site da Segurança Social e que pode consultar nesta ligação.
 

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