Pareceres
Inventário - aquisição de implantes dentários
4 Julho 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

Inventário - aquisição de implantes dentários
PT28533 – março de 2025

 

Determinado consultório presta serviços de medicina dentária. Recentemente comprou implantes e respetivos complementos. Não foram implantes destinados para um paciente em particular. Comprou em quantidade e depois, para adequar os implantes a cada paciente, o consultório tem uma impressora/fresadora 3D.
O investimento foi de grande valor e o consultório vai gastando esses implantes ao longo do tempo. Tendo isto em conta, deve considerar-se como mercadoria/matéria-prima?
Depois, quando colocar os implantes, deve discriminar a venda do implante e separar o valor da venda e de todo o serviço necessário para a colocação e acompanhamento?

 


Parecer técnico

 


O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento contabilístico da aquisição de implantes dentários por uma entidade.
Em termos contabilísticos, considerando que não é informado o normativo contabilístico aplicável, iremos assumir o pressuposto que a empresa aplica as normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) previstas no aviso n.º 8 256/2015, de 29 de julho.
Face ao exposto, e no que respeita à aquisição dos diversos bens para utilizar na atividade, teremos de atender ao tratamento contabilístico dos inventários que está previsto na NCRF 18 - Inventários.
Em termos contabilísticos, os bens destinados a serem vendidos no decurso da atividade normal da empresa, que, normalmente, se prevê de curto prazo, ou para serem objeto de consumo na realização de produção ou de prestação de serviços, são classificados como inventários, nos termos do parágrafo 6 da NCRF 18.
Nos termos do parágrafo 8 do referido normativo, «[o]s inventários englobam bens comprados e detidos para revenda incluindo, por exemplo, mercadorias compradas por um retalhista e detidas para revenda ou terrenos e outras propriedades detidas para revenda. Os inventários também englobam produtos acabados, ou trabalhos em curso que estejam a ser produzidos pela entidade e incluem materiais e consumíveis aguardando o seu uso no processo de produção. Consequentemente, as classificações comuns de inventários são: mercadorias, matérias-primas, consumíveis de produção, materiais, trabalhos em curso e produtos acabados. (...).»
Em termos de conceito, e no caso em concreto, cumpre notar que as mercadorias são bens adquiridos pela empresa com destino a venda, sem que sejam objeto de qualquer transformação substancial.
Por outro lado, as matérias-primas (matérias subsidiárias e de consumo) são bens adquiridos pela empresa que se destinam a ser incorporados no processo de produção, com o objetivo de obter produtos finais ou na realização de prestações de serviços.
Assim, no caso de uma entidade que presta serviços de medicina dentária, entendemos que os materiais são adquiridos para incorporar na realização de prestações de serviços, pelo que o seu registo deverá ser efetuado na conta 312 - Compras - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo.
Por sua vez, quanto aos bens que são adquiridos para posterior venda, sem que sejam objeto de qualquer transformação substancial, o seu registo deverá ser efetuado na conta 311 - Compras - Mercadorias.
O registo inicial na conta de matérias-primas e/ou mercadorias deve ser efetuado pelo respetivo custo de aquisição, podendo incluir todos os custos diretamente suportados com essa aquisição.
Face ao exposto, entendemos que pela entrada desses materiais em armazém há que proceder ao reconhecimento do inventário, conforme se segue, pelo custo de aquisição:
- Débito da conta 33 - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo; e/ou
- Débito da conta 32 - Mercadorias;
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 312 - Compras - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo; e/ou
- Crédito da conta 311 - Compras – Mercadorias.
Quando essas matérias-primas ou materiais de consumo forem utilizadas ou vendidas, o seu custo deve ser imputado ao custo de produção, em função das respetivas quantidades.
No que se refere ao reconhecimento como gasto, dos bens em causa, remetemos para os parágrafos 34 a 36 da referida NCRF 18, os quais nos remetem para as situações em que ocorre esta contabilização, e que transcrevemos de seguida.
«34 - Quando os inventários forem vendidos, a quantia escriturada desses inventários deve ser reconhecida como um gasto do período em que o respetivo rédito seja reconhecido. A quantia de qualquer ajustamento dos inventários para o valor realizável líquido e todas as perdas de inventários devem ser reconhecidas como um gasto do período em que o ajustamento ou perda ocorra. A quantia de qualquer reversão do ajustamento de inventários, proveniente de um aumento no valor realizável líquido, deve ser reconhecida como uma redução na quantia de inventários reconhecida como um gasto no período em que a reversão ocorra.
35 - A quantia de inventários reconhecida como um gasto durante o período, que é muitas vezes referida como o custo de venda, consiste nos custos previamente incluídos na mensuração do inventário agora vendido, nos gastos gerais de produção não imputados e nas quantias anormais de custos de produção de inventários. As circunstâncias da entidade também podem admitir a inclusão de outras quantias, tais como custos de distribuição.
36 - Alguns inventários podem ser imputados a outras contas do ativo, como por exemplo, inventários usados como um componente de ativos fixos tangíveis construídos para a própria entidade. Os inventários imputados desta forma a um outro ativo são reconhecidos como um gasto durante a vida útil desse ativo.»
Face ao exposto, entendemos que quando ocorrer a sua utilização e/ou venda se encontrarão cumpridos os requisitos impostos pela norma para o reconhecimento de um gasto.
Quanto à contabilização dos rendimentos, cumpre atender às disposições da NCRF 20 - Rédito.
Refere o parágrafo 7 da NCRF 20 que o rédito «(...) é o influxo bruto de benefícios económicos durante o período proveniente do decurso das atividades ordinárias de uma entidade quando esses influxos resultarem em aumentos de capital próprio, que não sejam aumentos relacionados com contribuições de participantes no capital próprio.»
No que se refere ao tratamento contabilístico dos réditos obtidos pela venda de bens, o mesmo encontra-se previsto pelos parágrafos 14 a 19 da referida NCRF 20, nos termos dos quais é concluído que o rédito será contabilizado, cumpridos que se encontrem diversos requisitos, dos quais destacamos a transferência para o comprador dos riscos e vantagens significativos da propriedade dos bens.
Adicionalmente, os parágrafos 20 a 28 preveem o tratamento contabilístico do rédito relativo às prestações de serviços, concluindo que o mesmo deve ser reconhecido nos períodos contabilísticos em que os serviços sejam prestados.
Assim, haverá que atender às notas de enquadramento do Código de Contas do SNC, que estabelecem as contas a utilizar conforme o tipo de operações estabelecido pelas NCRF, não existindo, no entanto, uma relação direta estabelecida entre estas contas e as rubricas dos modelos das demonstrações financeiras.
Por simplicidade, transcrevemos de seguida as notas de enquadramento à classe 7.
«71 - Vendas.
As vendas devem ser deduzidas do IVA e de outros impostos e incidências nos casos em que nela estejam incluídos.
72 - Prestações de serviços
Esta conta respeita aos trabalhos e serviços prestados que sejam próprios dos objetivos ou finalidades principais da entidade. Poderá integrar os materiais aplicados, no caso de estes não serem faturados separadamente. (...)»
Assim, no caso da venda de bens, o registo contabilístico será efetuado na conta 71 - Vendas.
No caso das prestações de serviços entendemos que os rendimentos serão contabilizados na conta 72 - Prestação de serviços. O valor dos bens integrados na prestação de serviços faz parte do valor do serviço, se não for faturado separadamente.
Note-se que, o facto de a prestação de serviços incluir a incorporação de bens previamente adquiridos, não significa que se deva reconhecer o rédito da venda desses bens em separado da prestação de serviços.
Na realidade, todas as prestações de serviços envolvem, em maior ou menor grau, a utilização de materiais diversos para a sua concretização, sendo o preço praticado determinado, também, em função dos encargos incorridos com os mesmos. Nuns casos os materiais são incorporados no próprio serviço, não sendo autonomizáveis, noutros são passíveis de autonomização e de débito separado ao cliente.
Se o sujeito passivo considera que os materiais adquiridos aos fornecedores são autonomizáveis e que assumem um valor importante da prestação de serviços efetuada, poderão os mesmos ser discriminados do valor dos serviços (mão-de-obra), na fatura dos clientes. Nesta situação, os ganhos obtidos relativos à prestação de serviços ficam autonomizados dos respeitantes a vendas de mercadorias.
Se o valor dos materiais incorporados na prestação de serviços for meramente acessório, poderá a faturação ser efetuada pelo valor global dos materiais e mão-de-obra, considerando a totalidade como prestação de serviços. Caso contrário, poderá nas faturas discriminar o valor dos materiais incluídos numa rubrica à parte. Nesta situação, os rendimentos obtidos são relativos a prestação de serviços e a vendas de mercadorias.
A questão do débito em conjunto ou separado dos bens e do serviço deve atender à natureza da operação, a qual decorre também dos termos acordados. Importa salientar que quando é contratado um serviço que se traduz na obtenção de um determinado resultado (empreitada), não parece ser de efetuar a discriminação entre produtos e mão-de-obra, pois aí o que importa é o resultado final; num contrato de empreitada, há lugar à prestação de um serviço com caraterísticas próprias que incorpora bens cuja individualidade se perde com essa incorporação.
Não obstante, pode haver situações em que se justifique a distinção e correspondente faturação em separado de serviços e venda de bens, por exemplo, por exigência contratual; ainda assim, a prestação não perde a natureza de empreitada.
Para além do cumprimento das normas fiscais, na emissão da fatura também terá de se atender à informação que se pretende prestar ao cliente (ou que este exija). Porém, não é o facto de se desagregar, com maior ou menor detalhe, uma dada operação que modificará a sua natureza, quer para efeitos de IVA quer para efeitos de registo contabilístico.
Neste sentido, entendemos que os registos contabilísticos podem ser:
No momento da faturação da prestação dos serviços, pelo rédito:
- Débito da conta 21 - Clientes
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 72X - Prestação de serviços; e/ou
- Crédito da conta 71X - Vendas.
Pelo consumo dos materiais:
- Débito da conta 612 - Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo; e/ou
- Débito da conta 611 - Custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas - Mercadorias;
Por contrapartida a:
- Crédito da conta 33 - Matérias-primas, subsidiárias e de consumo; e/ou
- Crédito da conta 32 - Mercadorias.